20 anos separam os dois crachás acima. O
da esquerda autorizava um jovem repórter da Rádio Jornal do Brasil/AM a cobrir
a Rio-92. O da direita foi obtido dias atrás para que o mesmo repórter
pudesse cobrir a Rio+20 pela TV Globo. Que o leitor não se engane : a
metamorfose mais impressionante não foi de ordem física (o tempo é implacável
com a gente, não é mesmo?). A Conferência Internacional da ONU sobre
Desenvolvimento e Meio Ambiente marcou de maneira ostensiva as disposições
que passaram a reger o meu destino pessoal e profissional nas últimas duas décadas.
À época da Rio-92 eu tinha 26 anos,
alguma afinidade com os assuntos ambientais, e uma perplexidade –
compartilhada com todos os demais colegas jornalistas que
participaram daquela cobertura – com o gigantismo e a variedade de assuntos “complexos”
daquela conferência. A ignorância dos jornalistas sobre os temas do encontro
era tão evidente que a maioria das redações contratou especialistas para
atuarem como consultores, articulistas ou comentaristas. Precisávamos
assimilar os jargões, reconhecer o que de relevante havia nos temas da
conferência e entender por que o Rio de Janeiro de repente havia se
transformado no lugar mais importante do mundo.
Para os padrões de hoje, a logística
de cobertura naquele período é digna de piedade. Lembro-me dos poucos
privilegiados que circulavam pela cidade com telefones portáteis gigantes
chamados de “celulares”. Quem como eu trabalhava em rádio corria para o
carro de reportagem para passar os flashes com a ajuda de um equipamento
motorola acoplado ao veículo com uma poderosa antena. Se o carro não estivesse
disponível, o jeito era apelar para os “orelhões”. Caiu a ficha? Por
favor, não ouse falar de internet. Outro privilégio reservado a um número
ainda mais reduzido de pessoas. A informação seguia num ritmo muito menos
alucinante do que hoje.
Passei a maior parte do tempo cobrindo o
Fórum Global, o encontro das Ongs no Aterro do Flamengo. Foi uma experiência
marcante. Não poderia supor que representantes da sociedade civil de
várias partes do mundo pudessem produzir diagnósticos e construir
propostas com tanta competência. Não percebia ser possível alcançar tamanho nível
de engajamento na área ambiental mesmo sem ser um ecologista. Não
imaginava que este gênero de assunto pudesse perpassar indistintamente todas as
áreas do saber e do conhecimento (transversalidade), do engenheiro ao teólogo,
do economista ao advogado, do arquiteto a dona de casa. Por fim, não fazia
a menor ideia de que a nossa geração estava testemunhando a maior
crise ambiental da História de toda a Humanidade ,e que isso deveria inspirar
– por razões óbvias – nosso senso de urgência.
Foram 45 “tratados” ( propostas) que
orientaram boa parte do movimento social e político espalhado pelo planeta. Recém
saído da ditadura, o Brasil de então estranhava aquele formigueiro humano multiétnico
e engajado em favor de um novo modelo de desenvolvimento mais justo, inclusivo
e sustentável.
Em mais de uma entrevista que fiz com o então
Secretário Nacional de Meio Ambiente, José Goldemberg (cargo que equivaleria
hoje a ministro de estado) ele revelou como as delegações dos países
reunidas no Riocentro desejavam saber detalhes do que estava acontecendo
no Aterro do Flamengo. Era algo novo até para eles. Na verdade, tudo o
que estava acontecendo no Rio naqueles dias de junho era inédito. O maior
encontro já realizado na História até então demarcou o início das negociações
do clima e da biodiversidade, a popularização da expressão “desenvolvimento
sustentável” e um jeito diferente de enxergar o mundo, já não tão extenso e
resiliente, mais frágil e vulnerável à nossa presença.
Guardar o crachá da Rio-92 até hoje revela
meu desejo de eternizar a lembrança de um período fecudante de ideias
e propósitos existenciais. 20 anos depois, olho para trás e vejo que boa parte
de minhas atividades profissionais e pessoais trazem a marca daquela cobertura. Como costuma
dizer um dos mais brilhantes jornalistas do Brasil, pioneiro na abordagem
dos assuntos ambientais na grande imprensa, Washington Novaes : “Acho que a questão
ambiental é ameaçadora para os jornalistas que têm uma vida pessoal muito pouco
adequada em termos ambientais”. A afirmação de Washington vale para
qualquer pessoa, em qualquer segmento profissional. Simplesmente não é
possível aprofundar conhecimentos nessa área sem realizar transformações
importantes nos próprios hábitos,comportamentos, estilo de vida e padrão
de consumo.
Não foi só o rosto do crachá. Muita
coisa mudou em 20 anos.
Por André Trigueiro - Fonte: G1 - Mundo Sustentável - Rio+20, em 14 de junho de 2012
Por André Trigueiro - Fonte: G1 - Mundo Sustentável - Rio+20, em 14 de junho de 2012
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